“O judaísmo deve fazer limpeza nas próprias linhas”, diz rabino
Entrevista com o professor da Universidade Pontifícia Gregoriana David Meyer
Johnk85
23.05.2014 // IMPRIMIR
A primeira coisa que mudou foi o reconhecimento oficial do Estado de Israel pela parte do Vaticano, coisa extremamente importante; isto muda completamente o contexto das relações entre o judaísmo e o cristianismo.
Não são muito 50 anos, mas dão a possibilidade de ver nos fatos as mudanças, e o fim do ensinamento do desprezo e a sua transformação real no ensinamento do Espírito.
Nós temos sempre mais uma perspectiva histórica que estabelece a qualidade desta relação, por isso, tudo mudou muito.
Entre os vários temas, tem um particularmente delicado: a problemática de alguns círculos judeus em Israel que preveem um grande ódio pelo cristianismo. É um fenômeno inédito, que não existia há 50 anos, mas nem mesmo há cinco anos. O judaísmo deve enfrentar este novo desafio, no qual nós, a comunidade judaica, não estávamos preparados.
Há duas semanas surgiu o caso dos famosos escritos anti-cristãos. O bispo de Nazaré foi ameaçado de morte em uma carta: “Todos os cristãos, exceto os protestantes e evangélicos, devem sair de Israel”. Como explicar este sentimento anti-cristão que o senhor mencionou, e mais concretamente como explica a revolta contra os católicos e não com os protestantes, por exemplo?
Existe uma razão, que para mim não é uma justificativa. As pessoas - que definirei loucos furiosos - autores destes tipos de cartas, dizem que os evangélicos dos Estados Unidos são aqueles que sustentam incondicionalmente o Estado de Israel, em vez disso o catolicismo teria uma voz mais crítica em relação à política israelense.
O problema de fundo é que o judaísmo precisa reconhecer pela primeira vez na sua história que existem extremistas ao interno de sua própria tradição. A nossa tradição religiosa é capaz de grande beleza, mas também de gerar violência e abominação, rejeição e ódio.
Novamente é uma novidade, e o judaísmo não estava preparado para uma leitura violenta do seu relacionamento com os outros. Hoje descobrimos que não estamos em tudo imunes a este tipo de deriva bárbara e de tudo retrógrado no sentido da tradição judaica.
Um dos desafios da viagem do Papa à Terra Santa será enfrentar esta dificuldade e dizer que como a tradição cristã precisou enfrentar no seu ensinamento o desprezo, hoje é o judaísmo que traz em si uma parte destes defeitos, e é o momento de fazer limpeza entre as suas linhas.
O fato que o papa tenha decidido abrir o acesso aos arquivos vaticanos, para que a Igreja possa reconhecer uma possível responsabilidade no período da II Guerra Mundial, não é um fator adicional de reconciliação para a comunidade judaica?
De fato, existem enormes fatores de reconciliação. Todos os últimos papas foram muito favoráveis ao judaísmo, com verdadeiras amizades, por isso o judaísmo tem todas as razões para reconhecer que existe uma real amizade judaico-cristã.
Esta amizade, porém, não pode passar sobre certas problemáticas políticas que devem permitir ao Vaticano de criticar a política de Israel quando é legítimo, como faz com outros Estados, em cada tipo de circunstâncias, e isto não deve ser um impacto sobre as relações dos judeus com os cristãos.
O problema está aqui: uma parte do espectro religioso de Israel funde Estado e religião. Existe uma parte de idolatria do Estado de Israel da parte de alguns pensadores do judaísmo da ala ultra-ortodoxa nacionalista, que idolatra o Estado, e deste modo cada forma de crítica a eles se torna um ataque ao Estado, o que dá espaço a reações insensatas.
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