Religiosos apoiam a umbanda e o candomblé

Em evento no Maracanã, diversos líderes religiosos
se manifestaram em apoio às religiões afro-brasileiras, que
recentemente foram questionadas em decisão do Juiz da 17ª Vara Federal
do Rio, ao negar o pedido do Ministério Público Federal para retirar
vídeos da internet que atacavam o candomblé e a umbanda: “A questão da
intolerância religiosa tem sido um fator importante para o ódio. Quando
um juiz de um Estado laico desrespeita a Constituição, colocando uma
opinião preconceituosa, se fomenta o ódio contra as religiões de matriz
africana”, disse o babalorixá Carlos Ivanir dos Santos
20 de Maio de 2014 às 09:15
Favela 247 − A
Agência Brasil publicou matéria
repercutindo a decisão do Juiz da 17ª Vara Federal do Rio, Eugênio Rosa
de Araújo, que negou o pedido do Ministério Público Federal (MPF) para
retirar da internet vídeos de intolerância contra religiões
afro-brasileiras, alegando que umbanda e o candomblé “não contêm os
traços necessários de uma religião”, um texto-base, algo como a Bíblia,
por exemplo, ou mesmo uma organização vertical com um Deus específico a
ser seguido. A publicação relata as manifestações de apoio ao pedido do
MPF dadas no Maracanã, na manhã de ontem, durante o lançamento da
campanha "Por um mundo sem armas, drogas, violência e racismo",
organizada pela Pastoral do Esporte da Arquidiocese do Rio para a Copa
do Mundo e que reuniu diversos líderes religiosos, entre eles, o dom
Roque Costa Souza, que representava o arcebispo do Rio, dom Orani
Tempesta. Dom Roque comentou a decisão do Juiz Eugênio Rosa, segundo
ele, em um estado laico, esse tipo de posição atrapalha um diálogo
inter-religioso que há tempos vem sendo construído em busca de
tolerância e respeito entre as religiões: “Se o país está dizendo que é
laico, e as religiões não têm que se intrometer em determinadas
situações, por que agora vem a Justiça querer definir o que é religião e
o que não é, se desde tanto tempo nós estamos nesse diálogo
inter-religioso e procurando aceitar uns aos outros com as nossas
diferenças do modo de cultuar Deus?”, comenta.
O babalorixá Carlos Ivanir dos Santos, também presente no Maracanã,
afirmou que essa decisão alimenta o momento difícil vivido pelo
candomblé, onde as agressões aos terreiros e seus fiéis vem aumentando,
conforme noticiamos
aqui no Favela 247,
e agradeceu o apoio dos demais líderes religiosos: "O que leva ao ódio é
a ignorância. É a ignorância que cria o que estamos vendo na Nigéria
[referindo-se ao grupo fundamentalista que sequestrou meninas por
acreditar que mulheres não devem estudar], onde um grupo quer impor a
sua verdade sobre outros".
O Deputado Federal Jean Wyllys, em
artigo publicado no Brasil 247,
criticou a decisão, que segundo ele, fere dispositivos constitucionais e
legais, além de violar tratados internacionais, como a Convenção
Americana sobre Direitos Humanos, conhecida como Pacto de San Jose da
Costa Rica, ratificada pelo Brasil em 1992 e que dispõe sobre a garantia
de não discriminação por motivo de raça, cor, sexo, idioma, religião,
opiniões, políticas ou de qualquer outra natureza, origem nacional ou
social, posição econômica, nascimento ou qualquer outra condição social.
E afirma: “Se há uma liberdade religiosa a ser limitada é a daquelas
religiões que usam dos meios de massa para difamar e promover a
intolerância contra outras religiões e divulgam práticas que põem em
risco a saúde coletiva, como pedir que pessoas abandonem tratamento de
câncer ou aids em nome de orações!”.
O procurador regional dos Direitos do Cidadão, Jaime Mitropoulos, em
matéria publicada pelo site GGN,
também comentou a decisão do Juiz da 17ª Vara Federal do Rio, lembrando
também, assim como o deputado Jean Wyllys, da quebra de tratados
internacionais e afirmando que essa posição desconsidera fatores
históricos e sociais: “A decisão causa perplexidade, pois ao invés de
conceder a tutela jurisdicional pretendida, optou-se pela definição do
que seria religião, negando os diversos diplomas internacionais que
tratam da matéria (Pacto Internacional Sobre os Direitos Civis e
Políticos, Pacto de São José da Costa Rica, etc.), a Constituição
Federal, bem como a Lei 12.288/10. Além disso, o ato nega a história e
os fatos sociais acerca da existência das religiões e das perseguições
que elas sofreram ao longo da história, desconsiderando por completo a
noção de que as religiões de matizes africanas estão ancoradas nos
princípios da oralidade, temporalidade, senioridade, na ancestralidade,
não necessitando de um texto básico para defini-las”.
Leia a seguir a reportagem da
Agência brasil.
Por Vinícius Lisboa para a Agência Brasil
Religiosos criticam decisão que não considera umbanda e candomblé religiões
Líderes de diversas religiões repudiaram hoje (19) a decisão do juiz
da 17ª Vara Federal do Rio, Eugênio Rosa de Araújo, que negou o pedido
de retirada de vídeos com mensagens de intolerância contra religiões
afro-brasileiras, por considerar que a umbanda e o candomblé “não contêm
os traços necessários de uma religião”, como um texto-base, a exemplo
da Bíblia, uma estrutura hierárquica e um Deus a ser venerado. As
críticas foram feitas durante o lançamento da campanha promovida pela
Pastoral do Esporte da Arquidiocese do Rio para a Copa do Mundo de 2014.
Intitulada "Por um mundo sem armas, drogas, violência e racismo", a
campanha foi promovida em um evento inter-religioso nesta segunda-feira,
no Estádio Jornalista Mário Filho, Maracanã. O babalorixá Carlos Ivanir
dos Santos afirmou que o candomblé vive tempos difíceis e agradeceu o
apoio de representantes de outras denominações religiosas que criticaram
a decisão: "O que leva ao ódio é a ignorância. É a ignorância que cria o
que estamos vendo na Nigéria [referindo-se ao grupo fundamentalista que
sequestrou meninas por acreditar que mulheres não devem estudar], onde
um grupo quer impor a sua verdade sobre outros".
De acordo com Santos, "A questão da intolerância religiosa tem sido
um fator importante para o ódio. Quando um juiz de um Estado laico
desrespeita a Constituição, colocando uma opinião preconceituosa, se
fomenta o ódio contra as religiões de matriz africana”, criticou,
classificando a argumentação do juiz como elitista e racista. Na
decisão, Eugênio Rosa de Araújo afirmou que “as manifestações religiosas
afro-brasileiras não se constituem em religiões, muito menos os vídeos
contidos no Google refletem um sistema de crença – são de mau gosto, mas
são manifestações de livre expressão de opinião”
A mãe Fátima Damas, umbandista, também defendeu sua religião contra a
visão do juiz. "É muita ignorância da parte dele. Ele precisa entender
que existe a cultura oral. É impraticável a gente aceitar que um homem
da lei abra a boca e faça uma coisa dessa. Queremos ouvi-lo e queremos
que ele nos ouça. Esperamos que se retrate", afirmou.
Líderes de outras religiões endossaram as críticas. Presidente do
Conselho de Igrejas Cristãs do Estado do Rio de Janeiro, a pastora
Lusmarina Campos Costa apoiou o Ministério Público Federal no Rio de
Janeiro (MPF/RJ), que solicitou a retirada dos 15 vídeos do YouTube:
"Não podemos aceitar o ódio ou a sua expressão de maneira nenhuma. Nos
colocamos solidários com o MPF no RJ, quando diz não aos vídeos que
incitam o ódio contra as religiões afro-brasileiras e permanecemos ao
lado quando ele recorre da decisão descabida do juiz federal que baseia o
seu julgamento em um argumento arcaico e obsoleto, desconsiderando a
complexidade do universo religioso brasileiro".
Representando o arcebispo do Rio, dom Orani Tempesta, o bispo
auxiliar dom Roque Costa Souza também se solidarizou com as religiões de
matriz africana. "Se o país está dizendo que é laico, e as religiões
não têm que se intrometer em determinadas situações, por que agora vem a
Justiça querer definir o que é religião e o que não é, se desde tanto
tempo nós estamos nesse diálogo inter-religioso e procurando aceitar uns
aos outros com as nossas diferenças do modo de cultuar Deus?”,
questionou, acrescentando que a Igreja Católica se posiciona contra essa
decisão.
O sacerdote budista Gyoushu Tadokoro também invocou a laicidade do
Estado para criticar a decisão. "O país é laico legalmente e qualquer
tipo de discriminação que coloque que isso é religião e isso não é cabe a
nós, religiosos", defendeu.
Membro da Sociedade Beneficente Islâmica do Rio de Janeiro, Sami
Ahmed Isbelle destacou a tradição das religiões africanas no Brasil.
"Essas são denominações existentes há muito tempo no Brasil, então, essa
é uma decisão completamente equivocada e fora de propósito. O que vai
gerar tudo isso é mais ignorância”, disse.
Isbelle também alertou: “Quando você coloca uma denominação que há
muito tempo já sofre um preconceito dentro do Brasil como não sendo uma
religião, isso pode estimular as pessoas a perseguirem, a cometerem atos
violentos contra eles, justificando que não é considerado religião".
O presidente da Federação Israelita do Estado Rio de Janeiro, Jayme
Salomão, pediu respeito às minorias. "Todo mundo que busca um Deus, nós
temos que reconhecer. Temos que reconhecer as minorias presentes no
Brasil. O Brasil tem que servir de exemplo de sucesso, de lugar onde
todas as religiões se agregam em paz".
A campanha "Por um mundo sem armas, drogas, violência e racismo" é o
tema da 14° Semana Municipal da Paz, que destaca a importância da
preservação da vida. Além de atividades de conscientização, a campanha
produziu a música Fé na Copa e ninguém pra escanteio, que será executada
nos eventos da arquidiocese antes, durante e depois do mundial de
futebol.